IGREJA E CULTURA - MERGULHO

Existe muita confusão na cosmovisão evangélica predominante em minha formação desde a adolescência, marcadamente asceta, exclusivista e arrogante, mas travestida de uma capa espiritual. Com muito esforço tenho aprendido a refletir como Nelson Bomilcar, músico que participou na década de 70 do movimento de abertura da igreja evangélica para a música brasileira, participando das primeiras equipes do Vencedores Por Cristo. Escrevendo sobre Música e Adoração na Igreja Brasileira ele destacou: 
“É importante lembrar e considerar que elementos divinos estão presentes em todas as culturas, inclusive a indígena e africana, que tanto influenciam a nossa cultura. O que o Diabo sempre tentará é distorcer a criação de Deus, confundindo nossa compreensão do que é lícito usarmos na evangelização e adoração” 
Parte da distorção citada por Bomilcar pode ser notada na expressão “igreja mundana” ou “mundanismo na igreja”. Sem pretender aprofundar o estudo exegético da palavra “mundo” na Bíblia, basta lembrar que ela pode significar: (1) a natureza, a criação, ou universo; 2) a humanidade, as pessoas; ou 3) o sistema de valores satânico. 
A igreja pode viver neste mundo físico onde vivem as pessoas a serem amadas sem ser contaminada com o mal. E mais, deve transformá-lo. Fomos enviados ao mundo em missão para servir. A interação com a cultura será necessária. A igreja é sal da terra e luz do mundo. Na oração sacerdotal Jesus não pediu que fossemos tirados do mundo, mas livres do Maligno e santificados pela Palavra. 
"Vós sois o sal da terra; e se o sal for insípido, com que se há de salgar? Para nada mais presta senão para se lançar fora, e ser pisado pelos homens. Vós sois a luz do mundo; não se pode esconder uma cidade edificada sobre um monte; nem se acende a candeia e se coloca debaixo do alqueire, mas no velador, e dá luz a todos que estão na casa. Assim resplandeça a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem a vosso Pai, que está nos céus". (Mt 5,13-16) 
"Não peço que os tires do mundo, mas que os livres do mal. Não são do mundo, como eu do mundo não sou. Santifica-os na tua verdade; a tua palavra é a verdade. Assim como tu me enviaste ao mundo, também eu os enviei ao mundo. (João 17,15-18) 
Essa parece ser a base bíblica do pensamento que subjaz o Pacto de Lausanne, documento elaborado no Congresso Mundial de Evangelização na cidade suíça em 1974, presidido por John Sttot, e que norteia a identidade evangelical desde então: 
“Uma vez que o homem é criatura de Deus, parte da sua cultura é rica em beleza e bondade; pelo fato de ter o homem caído, toda sua cultura (usos e costumes) está manchada pelo pecado e parte é de inspiração demoníaca”. 
A igreja é desafiada a encarnar a mensagem do Evangelho para comunicá-la num contexto cultural específico. Três atitudes básicas podem ser analisadas: 1) Igreja Esponja - absolve a cultura acriticamente; 2) Igreja Monastério - isola-se alienadamente; 3) Igreja Tempero - transforma o ambiente. A fidelidade ao Evangelho orientar o estabelecimento de limites saudáveis para o mergulho. 
O princípio orientador para o “mergulho cultural” da igreja deve ser o mesmo defendido por Bruce Nicholls em sua proposta de “Contextualização: uma teologia do evangelho e cultura”: “O Evangelho nunca é hospede da cultura; mas sempre seu juiz e redentor”. A experiência profunda com o poder redentivo do Evangelho nos capacita para a intervenção na cultura com o fim de sermos agentes de sua restauração.

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