EVANGELIZAÇÃO NA BÍBLIA: CRIAÇÃO E SALVAÇÃO




A Evangelização na Bíblia encontra assento inicial na relação entre as doutrinas da criação e salvação. Antigo e Novo Testamento são unânimes em vincular uma à outra. Deus cria para salvar e salva re-criando, creatio ex nihilo. Transforma o caos em cosmos. Além da relação fundamental salvação-criação, o texto sagrado foi estruturado de tal forma que os conceitos necessários para compreender a relação Deus-homem são tecidos pelas narrativas da criação, queda e promessa de redenção do homem. 
Cristo é o agente e o propósito da criação de Deus, o princípio ativo na estruturação do cosmos, e na revelação do plano divino para a salvação do homem. Por isso, René Padilla, em seus ensaios sobre o Reino e a Igreja, fala de ênfase cristológica do universo. “Todas as coisas foram feitas por intermédio dele, e sem ele nada do que foi feito se fez” (João 1.3). 
A Bíblia começa com uma cosmogonia, uma descrição da criação do mundo a partir da palavra criadora de Deus, o fiat divino. “No princípio criou Deus os céus e a terra... Disse Deus” (Gênesis 1.1 e 3). Esta descrição não pode ser compreendida, mas somente percebida. É instintiva, e não, racional. Segundo a Teologia Sistemática de Louis Berkhof, “a criação é descrita como um fato que somente aprendemos pela fé... Pela fé nós percebemos (não compreendemos) que o mundo foi... formado pela palavra de Deus, a palavra de poder de Deus”. 
Mas os escritos joaninos esclarecem que essa Palavra encarnou para recriar a vida e manifestar a glória divina. “E o Verbo se fez carne, e habitou entre nós, e vimos a sua glória, como a glória do unigênito do Pai, cheio de graça e de verdade (João 1,14). Por ser Cristo o agente da criação, nela está a primeira manifestação da vontade salvífica de Deus. O pensamento da salvação está implícito no ato criador. 
Por meio das coisas que foram criadas o homem pode perceber a divindade, o poder e os atributos de Deus. O apóstolo Paulo, quando se refere a isso, diz categoricamente que não existem desculpas para a humanidade em não glorificar a Deus. “Porquanto, o que de Deus se pode conhecer, neles se manifesta, porque Deus lhe manifestou. Pois os seus atributos invisíveis, o seu eterno poder e divindade, são claramente vistos desde a criação do mundo, sendo percebidos mediante as coisas criadas, de modo que eles são inescusáveis” (Romanos 1.19-20). 
Hans Walter Wolf em Bíblia Antigo Testamento confirma esta relação entre Criação e Salvação e lembra que. “toda criação serve de testemunho de que não há limites para as ações de Deus. A nova intervenção de Deus é mostrada como uma revelação de sua imensa glória e de seu poder salvífico comprovado”. 
O profeta Isaías já anunciava: “Assim diz o Senhor, teu redentor, e que te formou desde o ventre: Eu sou o Senhor que faço tudo, que sozinho estendo os céus, e espraio a terra por mim mesmo” (44,24). Na literatura isaiana a criação vincula-se com a eleição de Israel: “Mas agora, assim diz o Senhor que te criou, ó Jacó, e que te formou, ó Israel: Não temas, porque eu te remi; chamei-te pelo teu nome, tu és meu” (43,1). A salvação futura está atrelada à nova criação: “Eis que faço uma coisa nova, agora sairá à luz; porventura não a percebeis? Eis que porei um caminho no deserto, e rios no ermo” (43,19; 65,17). 
Escrevendo sobre a Proclamação do Evangelho, Karl Barth, o maior teólogo protestante do século XX encerra: “na Palavra da reconciliação há também a mensagem da criação”. Evangelizar a partir da Bíblia permite anunciar a esperança da salvação com segurança, pois a criação revela a vontade salvadora de Deus em Cristo e a história é o palco da graça. Espera da evangelização a criação de uma nova realidade pessoal e histórica. O poder criador e criativo de Deus continua operando no mundo. A igreja, corpo de Cristo, amplia sua obra no universo e representa a esperança da nova vida. 
Espera-se da evangelização o que a história já testemunhou ser possível, objetivamente mensurável, tangível. Esperamos o confronto com uma sociedade que avalia as pessoas pela profissão, o jeitinho brasileiro e a corrupção generalizada. Esperamos a restauração da juventude vencida pelo crack. Esperamos que o desenvolvimento sustentável seja mais que discurso. Agora clamamos “venha o teu reino, seja feita a tua vontade”, aguardando o dia em que diremos “bendito o que vem em nome do Senhor”.

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